Certa vez uma cigana tocou no meu braço insistentemente, Bem em frente ao banco Itau., enquanto eu tentava chegar à porta do banco. Apertei o passo, fechei a cara e olhei pra ela de rabo de olho tentando expressar minha presa e meu humor abalado por conta de um atraso exagerado, E eu tinha um pequeno incêndio financeiro pra apagar no próximo quarteirão e o que eu menos precisava naquele momento eram de previsões descabidas. Nem das climáticas. Mais dois passos e a cigana parecia ter se multiplicado agora meia dúzia delas invadia a calçada com vestidos estampados e lenços coloridos, fazendo uma abordagem escancarada. "Ô bonitão deixa eu te falar do teu mal de amor". Lembrei de uma tia que à menor variação de humor das mulheres da casa dizia na lata: "que coisa de homem mal amado". Eu era criança quando a ouvi falando isso da primeira vez e somente muitos anos depois é que entendi o que ela queria dizer. Comecei a rir no meio da calçada... que cara de mal amado eu devia estar apresentando, ainda que não fosse apenas aparente, pensei. E foi só rir prá que uma delas, toda de azul, pegasse no meu braço: "você debocha e foge do sofrimento do amor, mas ele pode chegar". Ergui uma sobrancelha pernóstica e irônica enquanto ela continuava: "me dá um trocado que eu te conto..." Não ouvi o resto da frase. Apressei mais o passo, mudo e decidido a fugir pra bem longe dela. Delas todas.Na volta do banco tomei o cuidado de ir pela calçada do outro lado da rua mas nestes dias quentes e úmidos, parece que quando mais se reza.estavam todas lá, no mesmo lado que eu. Passei quase pelo meio da rua prá não me aproximar demais e a cigana de azul me sorriu. Não consegui decifrar aquele sorriso porque, você sabe, os sorrisos na verdade se decifram pelos olhos. Mas parecia, assim, a cem metros, um misto de zombaria e simpatia e eu poderia jurar, se não estivesse tão longe, que era também de cumplicidade. Ou talvez eu queria que fosse. Por via das dúvidas, sorri de volta, desarmado. Por algum motivo, que não entendi muito bem, isso me deixou de alma leve.Alguns quarteirões mais abaixo e me vi em frente à lotérica da rua Sete... Mal de amor? Jura? Entrei na lotérica sem pensar duas vezes e apostei uns trocados que poderiam ter ido parar na mão da cigana. É, o descaso sempre foi minha melhor defesa e o meu maior sintoma de negação. Mal de amor... bem, se for inevitável, relaxa e chora. Mas mal de humor também não. Só me faltava essa,,, tai um mal que não vou sofrer nunca," mal de humor". Segui pensando com meus botões sobre uma frase que li por aí de alguém que afirma que problema bom é aquele que se resolve com dinheiro. Os que o dinheiro não resolve geralmente são os que doem. Bem, se for prá enfrentar dor e de mal de amor ainda por cima, que seja em Saigon, Blangadesch, Austrália ou até mesmo em Washington.
viagens longas que uma Mega Sena é bem capaz de proporcionar. E nem precisa ser acumulada.E então, percebi que eu finalmente estava de volta ao velho cotidiano. O dia estava chegando ao seu entardecer, e definitivamente, 2004 foi o melhor ano da minha vida, não ganhei na Mega Sena, mas em compensação ganhei um amor que dinheiro nenhum no mundo pode comprar.
Jairo Gudzowskyj Brandão